Mais uma sombra no chão. Definitivamente mais uma sombra. Eu sinto que pelo menos tenho que me defender. Ando pelas ruas - Na verdade, me economizo. Paro numa fila de cinema. Eu tenho que lembrar a mim mesma que não sou a bandida aqui. Aparentemente muita coisa esta me perturbando, mas essas pessoas que estão na minha frente atrás de mim nessa fila estão me deixando tonta. “Calma é o cacete”, resmungo entre os dentes. Cruzo os braços e fico na fila do cinema esperando a minha vez. Apegue-se ao que é espiritualmente superior sem fazer caso do que as outras pessoas pensem ou façam. Mantenha-se fiel ás suas verdadeiras aspirações, não importa o que esteja acontecendo em torno de você. Eu vou sobreviver a essa fila, vou ver o filme e voltar pro meu quarto. Só que não parecia estar funcionando. Bem, depois de eu tentar ficar na minha, fazer algumas listas bobas – do tipo: quantas pessoas usam vermelho na fila; quantas mulheres usam salto e coisa e tal -, eu realmente estava irritada com a demora. Eu disse a mim mesma 'Estou bem' e mostrei o meu sorriso habitual eu não me senti em desespero, mas em um tipo de desafio, eu escondi a minha mão tremula, porque a simpatia deles era tão irreal. É o primeiro e o último tempo para você viver por você mesmo, você deveria desenhar o seu próprio caminho após analisar um grande mapa. Pessoas. Decidi, enquanto a fila andava, que teria que me tornar mais sociável, afinal alguém vai sentar do meu lado enquanto o filme estiver rodando. Ok, eu vou ficar na minha. Não fuzilarei ninguém com minha metralhadora de mágoas. Ser simpática com gente errada causa danos irreversíveis em minha mente. Então, na verdade é só uma autodefesa. Odeio ser eu a lhe dizer, mas pessoas me dão nojo.
Finalmente chegou minha vez na bilheteria. ‘Quantas?’, a mulher teve a cara de pau de me perguntar quantas? É. Quantas? Só pode ser uma daquelas velhas mau comidas que fazem apostas na mesinha de bilhar, sim. Apostas do tipo: quem tortura mais garotas, perguntando quantas entradas ela quer para o cinema, enquanto esta estampada na cara dela que ela esta sozinha. Ela é sozinha. Ok, se não for aposta e ela não participar de nenhuma seita macabra, creio que seja só superação pessoal. Ela deve ter uma meta, contar quantas garotas fracassadas entram pela aquela porta totalmente sozinhas. ‘Uma’, respondi. - Apenas podemos falar de sensações nas percepções se as considerarmos em si mesmas, sem considerar o que significam.
Comprei uma Coca e alguns chocolates – são meus fies companheiros, nunca interrompem o filme para fazer xixi ou fazem algum comentário do tipo: ‘Noooossa, você viu aquilo?!’-, só achei estranho uma coisa, o fato das demais pessoas que me acompanhavam na fila estarem indo para a outra sala do cinema, ou seja, só eu que preferi ver ‘Tubarões Assassinos’? Tudo bem que filmes desse tipo costumam ter fãs violentos, mas trocar Tubarões por um romance qualquer é no mínimo tedioso e de mau gosto. Nossos pensamentos são as sombras de nossos sentimentos - sempre mais obscuros, mais vazios, mais simples que estes. Entrei na sala e realmente só havia ali mais dois garotos, que creio eu fugiram de casa para ver o filme. Só não sei como conseguiram entrar. Eu sentei. Podia escolher cerca de 60 poltronas. Qualquer uma. Sentei bem no meio. Nem tão na frente, nem tão no fundo. Mas, se por acaso houvesse algum acidente a espera de acontecer estava perto da saída de emergência. Afinal, o filme é de tubarões assassinos. O filme começou.
Sinto-me vazia. Tão vazia quanto esta sala de cinema. Eu tenho tudo, mas sinto como se não possuísse nada. Talvez seja a falta de valor que eu deveria dar as coisas. Talvez seja apenas impressão. Não importa. Eu estava sentindo um vazio. Um vazio tão familiar que chegava a ser incômodo. Apenas uma vez eu senti isso. Uma vez foi o suficiente para sentir todo o chão desabando aos meus pés, antes mesmo que eu aprendesse a voar. Agora que eu aprendi, acho injusto sentir o mesmo vazio de antes. Eu tenho tudo. Tudo que necessito, pelo menos eu penso que tenho. O que falta, então?! Se eu soubesse a resposta, não estaria me perguntando. Vocês vão aprender que nesta vida não se pode mais errar. Vão descobrir que entre as estrelas e o chão existe o mar. E aí então a euforia, um belo dia, vai passar e cairá sobre seu mundo, num segundo, a traição. E naquele momento a sala vazia do cinema se abriu. Estava tão concentrada em meus pensamentos que não fui capaz de perceber. Estava cega, surda e muda durante meus delírios. E então, repentinamente, fui interrompida de meus pensamentos com um "Posso me sentar ao seu lado?". Um rapaz tão encantador quanto seus olhos azuis estava parado ao meu lado, segurando um pacote de pipocas e lançando a mim um sorriso tão doce quanto sua voz. A sala de cinema não estava mais vazia. E, bem, nem eu. Porém, não tinha me dado conta disso. Respondi com a diferença, a cena de um tubarão estar definhando um marujo muito do estranho veio em boa hora, com cerca de 60 poltronas ali, por que ele escolheu justo a vazia que estava do meu lado? Isso provocou uma reação. É. Minha indiferença provocou uma reação. Ele simplesmente sentou. Não que meu coração bateu forte quando sua mão encostou de leve o meu braço que estava apoiado no braço da poltrona, o que acontece é que eu estava com frio. É. Faz frio em maio aqui onde eu moro. E também esse garoto não tem noção de divisas de território? Aquele espaço era meu por direito. Meu território. As cores dele eram lindas, digo ele cheirava bem também. O garoto não o braço da poltrona. Eu não estou nervosa. É que quando eu estou nervosa costumo a falar demais, não que ele ou a situação me deixem nervosa. Ok. Melhor eu parar de falar. Já tenho escrito que o meu silêncio é feito de gritos abafados. Mas a vida é apenas um arrendamento provisório - um parêntese entre dois insondáveis infinitos.
Ele escuta minha respiração, eu finjo não notar. Brinco com os canudinhos na Coca talvez esse barulho irrite ele, e faça-o sentar em outro lugar. Ele fingiu nem notar. O que infelizmente ele provou, estendendo o pacote de pipoca para mim. ‘Não, obrigada.’ Tentei colocar um pouco a mais de acidez no meu tom de voz, ele precisar saber quem manda aqui. – Ele só me olhou.
...- Não o quê?
- Não quero sua pipoca e me incomoda você sentar aqui. – pronto, falei.
Por outro lado, não podia deixar de suspeitar que ele estivesse esperando por isso.
- Tudo bem, se sente em outro lugar então.
– O quê? – perguntei irritada, com a voz mais esganiçada que nunca.
– Psiiiiiiiiiiiiiiiiiiu! – os dois garotos lá da frente pedindo silêncio.
- Você não pode estar falando sério, cara! – esbravejei em tom baixo.
– Bem. Só porque você tecnicamente chegou aqui primeiro não quer dizer que eu tenha que sair. – ele meio que riu -, os incomodados que se retirem.
A verdade é que ele esta certo. Merda! Ele não sairia dali, e nem eu. Menos provável ainda, assim seria como se ele tivesse ganhado. Certo, vou admitir. Entrei
- Você esqueceu lá dentro – disse ele.
– Aham, já estava indo buscar. – falei.
- Você está sempre indo de um lado para outro, você não pára, mas afinal, do que você está fugindo? - perguntou ele. Riu - seja o que for essa coisa da qual você está fugindo, acho que ela não vai te alcançar nunca.
- Cale a boca! Você não me conhece .. - sibilei com os dentes trincados - Saia de perto de mim! - E eu lhe dirigi a maior frase que já havia dito em toda a minha vida. - Agora. - Completei.