30 maio, 2008

Br-43

Um dia alguém me disse que a saudade é o sentimento mais urgente, eu sou uma urgência literalmente então. Tenho tanta saudade acumulada em meu vazio, e ela quando não cabe mais transborda nos olhos e de uma forma muito desgraçada doe. Não sei quem inventou a distância, mas que o filho de uma égua não passe na minha frente, eu mato. Eu mato!
Sou alguém quem encontra as mais fantásticas pessoas ao acaso, e incrível como as mesmas, como que por sina, se localizam no mínimo a 300 km de distancia de mim. Isso é cruel, a maioria nunca irei conhecer pessoalmente, não vou poder pegar na mão ou abraçar – quando você estiver abraçando, não seja o primeiro a soltar -, isso é fato. Não dá pra acreditar em tudo que acontece na internet, está tudo tão rápido. Palavras não dizem nada, e elas podem perder o valor, quando as pessoas se mostram incapazes de provar o que estão falando. Queria poder viajar para SC, MG, SP, RJ, TO ou só ate ali em Santa Maria. Eu que queria fugir para o México nem condições de fugir de mim mesma tenho. Queria encontrar todos eles, essas pessoas que se tornaram tão especiais, pessoas que eu valorizo por estarem na minha vida, pessoas que eu consigo ser o que realmente sou, pessoas que simplesmente preciso nos meus dias. A vontade de deixar tudo aqui e ir caminhando até eles é enorme, um sentimento de amizade e mutualismo. Algo que você sabe que vai levar para a vida toda e por toda a vida. É quando você tem certeza que ser você mesmo basta para que alguém possa gostar de você pelo que você se tornou e pelo que demonstra ser. Sem nunca ter te visto ou dividido as batatinhas com você. Às vezes as pessoas são bonitas.
Não pela aparência física. Nem pelo que dizem. Só pelo que são. Pelo que elas nos fazem sentir.

A gente corre o risco de chorar um pouco quando se deixa cativar, é preciso exigir de cada o que cada um pode dar, a autoridade repousa sobre a razão!
Mas, quer saber o que é mais cruel? E a distâncias das amizades que eu tinha, das amizades em que eu acreditei, das amizades em quem eu vivi. Pessoas que moram do meu lado, que eu vejo todo dia na escola e que agora, não sei se por falta de coragem já não olham na minha cara. Eu tenho que perder essa minha mania de provocar as pessoas. Eu não consigo manter amizades. Sou alguém que acumula desafeto e coleciona inimigo, mas sou grata por ter pessoas dignas e a quem eu respeito e admiro de verdade em meus dias. Eu descobri isso não faz muito tempo, mas foi bem a tempo. Abraços vazios, olhares de gelo. Tão descartável quanto cascas no chão. Eu não me importo. O não às vezes pode ser muito melhor que o sim, por que eu não sou feita de papel? Preciso aprender a me respeitar, saber de quem eu devo me afastar e um dia posso não voltar, minha cama vai continuar sozinha! Muitas vezes o que conta não é o que se dá, mas o que se cede. Eu até agora só cedi, dei tudo de mim, fiz tudo por amizades ‘made in Paraguai’, me dei por inteira para vê-las sorrirem. Acho-me tão patética, eu sou isso. Isso. As pessoas me usam e depois me abandonam. Eu não perdi nada, quem perdeu foram elas. Eu não me importo. Não derramei nenhuma lágrima, não sei se agora as coisas estão de cabeça para baixo ou se só estão se ajeitando no lugar a que pertencem. Assim sempre devia ter sido. Eu quase posso falar a minha vida é que grita. Odeio quem me rouba a solidão sem em troca me oferecer verdadeira companhia.

Eu acreditava que o importante é ter amigos e histórias pra contar, histórias eu posso inventar. Amigos eu tenho, poucos, mas amigos.
Os que correram comigo continuam do meu lado, costumo chamá-los de pais. Quando o vilão é você mesmo tudo se torna mais divertido, a falsidade é tão repugnante quanto essas pessoas que um dia eu amei que um dia eu fiz planos, que um dia eu acreditei. E eu sou mais repugnantes que eles.
Suponho que me entender não é uma questão de inteligência e sim de sentir, de entrar em contato. O porem é que não é qualquer um que deixo chegar perto ou que consegue sentir.
Descobri a amizade em pessoas que até então eu só pensava que existia e me sinto muito tola por não ter percebido antes quem realmente estava do meu lado. Tenho amigos que não sabem o quanto são meus amigos. Não percebem o amor que lhes devoto e a absoluta necessidade que tenho deles. A amizade é um sentimento mais nobre do que o amor. Eis que permite que o objeto dela se divida em outros afetos, enquanto o amor tem intrínseco o ciúme, que não admite a rivalidade. E eu poderia suportar, embora não sem dor, que tivessem morrido todos os meus amores, mas enlouqueceria se morressem todos os meus amigos! Até mesmo aqueles que não percebem o quanto são meus amigos e o quanto minha vida depende de suas existências. A alguns deles não procuro, basta-me saber que eles existem. Esta mera condição me encoraja a seguir em frente pela vida. Mas, porque não os procuro com assiduidade, não posso lhes dizer o quanto gosto deles. Eles não iriam acreditar. Muitos deles estão lendo esta crônica e não sabem que estão incluídos na sagrada relação de meus amigos. Mas é delicioso que eu saiba e sinta que os adoro, embora não declare e não os procure.
Mas, isso não os impede de pegarem um ônibus, avião, barquinho, bicicleta, carona de algum psicopata desconhecido ou o que seja para vir me abraçar. Aceito telefonemas e cartas também. Mas só uma coisa eu exijo, o fato de vocês sorrirem porque existe alguém que agradece todo dia por te ter na vida.
A distancia não existe quando se ta perto por uma união/ligação de alma, estrelar ou simplesmente por estar junto. A distancia desaparece quando tenho a certeza que se morrer hoje, haverá pessoas que derramaram uma lágrima.

28 maio, 2008

Vamos fazer amor?

Tem pouco espaço aqui. Deixe-me resmungar as coisas que acho que sei. Veja e sinta as coisas como se elas fossem o que realmente são: passageiras. Calendários me irritam, é estranho. Sinto-me como se incomodasse cada vez que lembro de algo que me fez bem ou que me fez sorrir. Tudo bem que foram poucos casos, mas foram tão intensos. Cara, eu sou uma mortal! Isso quer dizer que você não precisa me fazer sangrar para saber que eu estou viva.
Suponho que irei lhe decepcionar, esse quase texto não ira te ensinar a como chegar ao orgasmo e conseguir mantê-lo por mais de 10 segundos, não te dará instruções de como persuadir sua vizinha para levá-la para cama ou o que fazer quando seus pais te pegam transando no sofá da casa da tia Benedita – porra, você não sabe que nunca se transa no sofá de sua tia? -, vou abordar aqui o que me atormenta mais, aquilo que me faz ser um pouco miserável, minha farsa de cada dia, meu objetivo bento: o amor.

As palavras certas não existem no universo inteiro. E o que me faz pensar que eu poderei roubar a certeza das palavras? É. Oi, sou uma fracassada. Nunca tive sucesso em paixões, nunca amei alguém. Já escrevi cartas e chorei. Já imaginei beijos e sessões da tarde. Já quis ser única e especial para alguém. Mas, faz tempo. As pessoas que pensam que me conhecem dizem que eu preciso me apaixonar de novo. Talvez eu precise, a questão é que eu nunca escuto ninguém. Adoro ser manipulada. E mesmo que escutasse não vou sair por ai usando uma camiseta estampada com algo do tipo: “Fique comigo, pois é o mais perto que você chegará do céu”, “Meu beijo é uma delicia! Você deveria experimentar”, “Por favor, se apaixone por mim, prometo pagar minha parte em todos os encontros”. Nem pense que colocarei anuncio no jornal ou que sairei na rua desesperada atrás da minha alma gêmea. Isso dá trabalho. Se apaixonar cansa. Amar dá trabalho. Ok, eu não agüento mais esse tédio, você acha que a camiseta deveria ser verde ou amarela?
Calma Luara!- não tenho esse tipo de obsessão não, diabos... Li o suficiente pra saber como viver depois de uma guerra civil, um Armageddon, coração partido, chute na bunda, fora, invasão alienígena e seqüestro relâmpago e outras catástrofes relacionadas.
Mas, também aprendi que amor não se conjuga no passado, ou você ama pra sempre ou nunca se amou de verdade. Amar pela metade é tão dolorido e cretino tal como fugir do amor, no entanto na minha situação não posso apelar, prefiro ser a cretina covarde que não ama porque foge. Não que eu não saiba amar, eu só não sei como executar o amor. E não sirvo pra amar pela metade.
Penso: quando você não tem amor, você ainda tem as estradas.

O amor é uma espécie de preconceito. A gente ama o que precisa, ama o que faz sentir bem, ama o que é conveniente. Como pode dizer que ama uma pessoa quando há dez mil outras no mundo que você amaria mais se conhecesse? Mas a gente nunca conhece. Então é como se cada desconhecido fosse um amor que ainda não conhecemos - as pessoas confundem simpatia com quase amor. Amor é banal, é inevitável, tudo ele suporta, tudo ele perdoa, tudo ele espera. Distante o meu amor, se me afigura. O amor como um patético tormento, pensar nele é morrer de desventura, não pensar é matar meu pensamento.
Não sou sujeita a um amor indigno, e muito menos pessoas que tratam o amor do jeito mais feliz o possível, o amor é algo por qual eu já não quero viver, ele machuca mais que qualquer coisa no mundo, assim como todos acham que é lindo, eu acho repugnante – sim, e sou uma fracassada. O relacionamento é apenas o que fazemos dele. Sem isso, não é mais que um monte de hipocrisias. Fraudes e falatórios. Porque convenhamos, ultimamente o amor dura tanto quanto ofertas das Casas Bahia, depois de algumas trocas, mútuas ou não, vira só um relacionamento. Mas, se existir amor realmente (o amor não existe. Existe atração sexual.), daquele tipo que se sabe e se demonstra – falo de manifestações públicas de afeto, músicas, poesias, flores e encontros “ao acaso”, que fique claro. Se vier acompanhando de um belo bíceps e sorriso encantador, digamos que as coisas melhoram -, que se sente e que te faz ser a pessoa mais idiota da face da Terra, que me faça não conseguir tirar os olhos do individuo, que me faça sorrir feito boba... Ai ai, por favor se você souber como me avise. Me de a receita e vamos fazer amor.
Precisamos prestar atenção, quem não sabe o que procura, não dá valor ao que encontra. Coincidência é um termo usado por tolos e mentirosos. Todos mentem por uma razão e razões é o que não faltam. O coração é o pêndulo universal de todos os ritmos, a mentira dança no seu ritmo, a saudade senta, o amor rebola. Talvez eu possa ser uma desconhecida – oi, você quer se apaixonar por mim? -, preciso que alguém se apaixone. Não quero ficar para “titia”, não quero ficar para tia Benedita! Juro que se você transar no sofá da minha sala, você irá se arrepender. E eu falo sério.

P.s.: nunca ame a outra pessoa realmente além da do relacionamento anterior;

P.s.s.: e os bêbados, calem a boca! Não quero rimas de amor.

26 maio, 2008

De costas para o mundo

Outro dia me peguei observando – na verdade sempre observei. Para obter êxito nesse mundo temos de parecer idiota - uma garota qualquer. Aquele cabelo indefinido, talvez a parte do seu DNA responsável pelo cabelo tenha um pouco de sua essência afro-descendente. Seus olhos eram grandes e brilhantes. Seu cheiro era gostoso - se você não confia na minha integridade que pelo menos confie no meu bom gosto. Eu não me lembro onde estava só sei que aquela garota me acompanha. Surpreendia-me a maneira como ela disfarçava bem a indiferença de tudo ao seu redor, ela acha que carrega o mundo nas costas, então age como se estivesse de costas para o mundo. A garota dos cabelos negros prefere o desprezo de quem a odeio ao sorriso de quem finge ama-lá. Nem sua própria sombra se parece com ela, é alguém sem vida social que escuta mais música do que saudável que tem uma pequena aversão a aranhas e quando encontra o céu se torna uma pastora de nuvens.
Ela me olhou uma única vez, e foi quando tive a sensação de que ela me salvaria. Sei que essa qualquer quer terminar tudo antes do fim. Atalhos, retalhos e sobras. Ela não passa da bomba-relógio que vai explodir em suas mãos.
Ela sabe ser arrogante, ela tem antipatia gratuita, e você continua voltando sabendo que vai ter mais. Porque ela é uma beleza amarga, ela é um mistério, ela é muito para você. "Eu bem que gostaria de voar", disse ela. “Daí eu poderia fugir de tudo”.
Agora sei o quanto ela é estranha e está piorando a cada dia. Mais uma dose de desapego, ela se embriaga com tal sentimento. Se queres lhe dar uma flor, dê antes que ela morra. Não sei o que fizeram comigo, imagino o que fizeram com ela. Mas, ainda sim ela sorri e caminha como se tivesse pisando em bolhas. Tem um lado dela que fala e outro que cala, como um escândalo ao meio-dia.

- Você pinta a casa de branco. E a enche de barulho. E ainda assim estará faltando algo. - a senti dizer.

Por que ela se contorce como se não parecesse notável? Talvez ela só seja um velho pedaço de carvão. Mas, um dia, será um diamante. É uma bela metafísica bruta. Antes de continuar meu destino, não posso permitir que esta pessoa suma, podemos nos tornar amigas. Ela vai me entender. Sim, ela vai!
Essa garota é a teoria do Caos. Não que eu seja um caos, ela é só a teoria.
Será que algo importa pra ela, será que ela ama alguém? Pode ser que ela se importe com algo, acho que ela sabe dançar. Escuto seu pensamento:

- Humanista é uma pessoa com grande interesse pelos seres humanos. Meu cachorro é humanista. - ela suspira cansada e meche o canto da boca de maneira sarcástica.

Creio que minhas respostas estão respondidas. Não me venha com retóricas. Eu sou apenas mais uma, ela é apenas mais uma. Nós somos uma. Você pode esperar que ela sempre lhe de uma opinião franca, mas não tentará ensiná-lo como viver.
Ela se sentou na calçada e tagarela, minha pouca quantidade de sal nem faz mais diferença, eu não sou notável. Alguém diga a ela que fugir de navio ilegalmente para outro continente com alguém que tu acabaste de conhecer é deveras perigoso! Ela só quer fazer a vida valer a pena, morrer não terá graça. Será que tem jujubas no céu?
Tenho apenas duas mãos e o sentimento do mundo. O imperfeito, o surreal e que me leve à insanidade já bastavam quando me sentava com ela no cordão da calçada. As coisas tangíveis tornam-se insensíveis à palma da mão. Vale lembra que a sociedade arranhou-me um pouco a franca simplicidade de temperamento. Sou apenas o improviso e aquela estranha sou eu quando estou acordada.

25 maio, 2008

E se o mundo acabasse amanhã?

Não restaria muito tempo a favor, você provavelmente entraria em desespero e se comportaria feito barata tonta. Tem certas coisas que eu não sei dizer, mas seria o último dia de simular a eternidade das minhas relações, e seriam as simulações mais reais que presenciaria.
Feche os olhos e pense se vale a pena trocar o que você tem de mais importante por um único momento. A verdade é que não vale, não vale mesmo. Talvez.
Não sei qual seria meu último pedido. Acho que iria querer ficar com meus pais e comer muito chocolate, muito mesmo – afinal, não iria precisar me preocupar se entraria na calça no dia seguinte. O mundo vai acabar e eu vou junto. Legal.
Acho que só assim as pessoas se dariam conta de quanto tempo foi perdido, mesmo morrendo eu iria me divertir. Mas, se eu fosse à única, a saber, disso não contaria a ninguém. Acho que a civilização não merece tal pancada. Mentira. Merece sim. O, porém é que ninguém merece viver o último dia de sua vida em algum manicômio ou delegacia.
Imagino que teria correrias para declarar o amor e a importância que alguém tem para alguém. As floriculturas, lojas de presentes, restaurantes e o que seja nunca lucrariam tanto. Mas, de que vai adiantar esse superávit se ninguém mais acordaria? Nunca amamos ninguém. Amamos, tão-somente, a idéia que fazemos de alguém. É a um conceito nosso - em suma, é a nós mesmos - que amamos. Isso é verdade em toda a escala do amor. E se fosse à última vez que você pudesse perdoar? Que você pudesse amar? Todas essas definições do amor fariam sentido, tudo o que eu alimento secamente á tanto tempo me serviria para algo? É. Eu deprimo a mim mesma.

O mundo não precisa de heróis para salvá-lo, nós que precisamos de heróis para nos salvar do mundo. Vivi sempre mais à vontade em mundos emprestados. Eu sou a combinação perfeita entre um artista desconhecido e uma obra pouco interessante. Sou antipática e sarcástica com orgulho, embora poucos sejam capazes de entender meu eterno sarcasmo. Não se deixe levar pelo inverno da vida, meu caro. Não congele seu coração. Não congele. O mundo pode acabar amanhã. E eu me fortaleço na tua falha. Se o amanhã não existisse, talvez tivesse muito mais sentido você fazer tudo hoje. Seriamos mais felizes, por que quando sabemos que iremos perder damos tanto valor?Porque teu medo és tu mesmo.
Rompi com todo esse universo e costumo falar o que penso, por isso ando bastante calada. Acho que se o mundo acabasse a única coisa que eu gostaria de evitar é a solidão.
Sofro de cafonice intelectual e drama ao extremo, mas se eu peco é na vontade. E você faria o mesmo. Ou não.

E se o mundo acabar amanha? Você já fez o que deveria fazer?

23 maio, 2008

Ignorar do verbo te odeio

Dizem que não sirvo pra gostar de ninguém, que não faço nada que não seja pro meu bem. Tenho muito pudor de parecer ridícula melosa piegas bregas romântica banal, sigo tranqüila me esquivando da estagnação. Sou um tipo de pessoa que não segue regras, sirvo para exceções.
Amar incondicionalmente é a morte certa para qualquer tipo de amor, afeição ou amizade. Amar incondicionalmente é doença, talvez tratável talvez não, mas é desvio psicológico grave e perigoso. O amor é sempre e simplíssimo condicional. "Eu te amo porque você é assim”, "Eu te amo porque você me faz sentir bem”, "Eu te amo porque alguma coisa". Não existe amar de graça mesmo que não se compreenda bem a razão, o motivo causal. Mas com certeza não é à toa. E talvez por isso, prefiro adotar o ódio, a indiferença e tudo aquilo que me faz ser alguém desprezível. Nunca consegui adiar a dor de me sentir sozinha, e pra falar a verdade toda essa solidão me faz bem, eu espero.

Fico tonta de mim mesma, sei o que quero e finjo não saber. É tão mais fácil vegetar. Eu me preocupo, eu sinto fome e sinto saudade, como todo mundo. Mas, não quero ser padronizada nesse plural efusivo de desastres. É preciso ver o trenzinho da montanha russa correr alucinadamente para dentro do abismo e, ainda assim, achar que o abismo pode ser legal ou, na verdade, que pode não ser um abismo. Mesmo que seja o mesmo abismo de antes. Mesmo que seja o mesmo abismo de sempre. Eu estou na beira do abismo, pode me empurrar, nem me importo.
Consequentemente preciso corroer qualquer tipo de sensibilidade progressiva, preciso ser má, preciso sobreviver. Não sei ao certo se sempre digo o mesmo, com palavras diferentes, a questão é que sempre digo tudo. Ou não. Sou egoísta e não irei dividir minhas jujubas com você.
O problema da solidão consiste em como preservá-la, eu me esforço. Muito. Então, continuarei assim até o momento de salvar uma vida, só assim meu peito voltará a pulsar. E eu conseguirei? O mais difícil vai ser deixar de me habituar á todo esse inferno pessoal, e voltar a sorrir e crer num destino. Nós, as cobaias, vivemos muito sós.

Voltamos para o verbo de meu uso pessoal mais freqüente; não há quem não se odeie. Eu mesmo só penso que me amo porque odeio muito mais os outros do que a mim mesma. Eu não sou um manifesto. Eu não sou um movimento de vanguarda, não sou um grupo revolucionário, nem uma facção terrorista, um protesto ou uma bobagem. Não sou um grito, um grito que emerge do asfalto, um grito de ajuda. Se você não é, eu também não sou. Eu sou o outro. Eu sou aquilo que fizeram de mim. Aprendi a odiar, é muito mais fácil que amar. Minha fadiga implora pelo fácil, minha alma clama pelo desafio. Já disse que odeio matemática?
Amar é cansar-se de estar só. Eu ainda não cansei. Pra que querer uma falsa companhia se no final tudo volta ao inicio? Ninguém se separa, as pessoas se abandonam.
Nada do que tento expor em palavras tem nexo mais é assim que eu gosto. A solidão só me ensinou a ser só. Sigo tranqüila na escuridão.
Não há nada a ser esperado. Nem desesperado. A verdade é que ser muito é muito pouco. E assim é a vida muitas vezes insatisfatória, frequentemente cruel. Em geral chata por vezes linda e ocasionalmente estimulante me faz ter vontade de abandonar todos meus planos de isolamento fazer um cartaz escrito ‘free hugs’ – sim, inglês é mais chique-, e sair pelas ruas acumulando o maior número de abraços. Mas, ignore do verbo te odeio.
O ser humano é um ser de desejo. É da nossa natureza buscar sempre um objeto que preencha uma ausência primordial. Mas, quando este objeto é conquistado, o desejo perde o significado. E assim seguimos como o rei Sisifo na mitologia, condenado a empurrar uma pedra para o alto de uma montanha para vê-la descer tão logo chegasse lá, e assim começar a tarefa mais uma vez. Odiar é ignorar a pedra e deixá-la rolar.
Odeio um monte de coisa, mas no fim tenho que suportar quase tudo.
E mesmo assim nada é certo, exceto de que tudo que você sabe pode mudar - eu não coloco a minha mão no fogo por mim.
E até hoje implico com esse inocente verbo ‘ignorar’, sobretudo no singular do presente do indicativo. Não me odeie mais do que acabarei odiando a mim mesma – não esta em meus objetivos entrar no Guinnes.

20 maio, 2008

Mãos dadas

Era verão de 95, lembro-me como se fosse ontem. A gente costumava se encontrar perto da parada por volta das duas da tarde, quase como um ritual. Éramos em 9 – 8 garotos e como você pode constatar eu era a única que usava calçinha ali. Amigos de infância, desde que começamos a engatinhar. Onde um estava o outro estava. Era assim. Algo de sentimento e de necessidade. Mas, ali no meio havia um garoto em especial, o mais lindo dos mortais, Guilherme. Ele e eu usávamos a presença do outro para transbordar manifestações de sorrisos e brincadeiras. Ele era meu melhor amigo, meu melhor amor. Modéstia parte, quem colocava ordem naquele bando de garotos toscos e bobos era eu, não creio que fosse pela minha aparência física – eu era gorda e chata. Hoje eu sou gorda e chata. Enfim. -, acho que minha sagaz esperteza os surpreendia, os planos mais maquiavélicos eram elaborados por mim, e eles faziam o que eu mandava. Sempre achei que me dou bem como líder. Apertar a campainha da vizinha loca e sair correndo, abrir a portinhola para o cachorro do velho coronel Soares fugir, assustar as outras menininhas e cortar cabelos alheios...tudo era tão inocente! Mas, o que nos deixava mais alegre era comprar chiclete Ping-pong e fazer competição de quem conseguia fazer a bola maior – adivinhe quem sempre ganhava? Pois é. -, e depois jogar futebol na cancha do lado de casa. O Guilherme era bom, me lembro que ele era o melhor dos garotos. Ele sempre me escolhia pro seu time, eu corria atrás da bola feito loca, porque se fizesse gol teria um motivo qualquer para abraçá-lo. Eu fazia gol. Muitos gols. Acho que tempos como esses me lembram que tenho que manter meus pés no chão. Minhas desequilibradas palavras são o luxo do meu silêncio. Deixe-me sentir o vento que logo se segue a historia.

Assim foi até 99, um dia minha mãe chegou braba em casa, era de tarde eu estava vendo Chavez - até hoje não sei como ele consegue viver dentro de um baril, porra, esse cara é o cara! -, acredito que ela soube disfarçar bem a decepção, talvez. A professora havia telefonado para ela e marcado uma reunião particular. E adivinha qual o assunto da reunião: eu – dã -, a professora encheu a cabeça da minha mãe, dizendo que eu já estava crescendo e que deveria me relacionar com as meninas, deixar o time de futebol da escola e me afastar dos garotos. Quando ela me disse isso, eu corri. Não sabia pra onde estava indo, nem o que iria fazer, eu sou corri. Antes do anoitecer eu voltei para casa, sabia que ia ser pior quando meu pai chegasse, e eu havia decorado um amontoado de motivos para fazê-los desistir dessa idéia absurda. Abri a porta e meu pai ainda não tinha chegado, minha mãe estava na sala me esperando. Eu voltei a fechar a porta e sentei nos degraus da frente de casa. Algum tempo depois minha mãe apareceu. Nada que eu decorei saiu, me deu um branco e chorei, chorei muito. Então, ela disse que se eu entrasse para um grupo de dança poderia continuar no futebol e teria minha vida normal. O Guilherme continuaria ali. No outro dia no recreio contei pro Gui o trato, ou melhor, chantagem que minha mãe usou para me ajustar a sociedade – cheguei a comentar que ela ameaçou cortar meus cachinhos? -, ele achou engraçado e disse que ia rir muito se me visse rodopiando feito pião. Eu, entretanto não achei nenhuma graça. Naquele dia não fui do time dele.

O pássaro com o espinho cravado no peito segue uma lei imutável; impelido por ela, não sabe o que é empalar-se, e morre cantando. No instante em que o espinho penetra não há consciência nele de morrer futuro; limita-se a cantar e canta até que não lhe sobra vida para emitir uma única nota. Mas nós, quando enfiamos os espinhos no peito, nós sabemos. Compreendemos. E assim mesmo o fazemos. Assim mesmo o fazemos. Ficamos alguns dias sem nos falar, na verdade quatro dias. E eu pensava que seriam os quatros piores dias da minha vida, pobre de mim, nem sabia o que me esperava.
No sábado ele apareceu lá em casa me convidando para andar de carrinho de lomba, eu no intuito de o fazer sentir falta de mim e perceber o quanto era importante, simplesmente esnobei a idéia. Eu tinha que ensaiar porque no fim de semana seguinte teria já minha primeira apresentação. Não sei se foi miragem, mas me pareceu que ele queria ficar. No domingo joguei futebol com os garotos e ele não apareceu. Nossa, como estava sentindo sua falta, pobre de mim, nem sabia o que me esperava.
Na segunda feira ele trouxe um pacote Trakinas de merenda para mim, ele costumava sustentar minha glicose diária, eu adorava. O Guilherme era o tipo de pessoa que você encontra paz em sua presença, que o sorriso tranqüiliza e quando te abraça parece que tudo aquilo que está perdido se transforma em borboletas. Eu tinha uma coleção de borboletas. Fizemos as pazes e no dia seguinte voltou tudo como era antes, pobre de mim, nem sabia o que me esperava. Na sexta feira à noite, era tarde, aliás, ele bateu na porta da minha casa e disse pra minha mãe que precisava falar comigo e que era importante. Minha mãe, então me chamou. Quando o vi, senti algo que nunca tinha sentido antes, quer dizer, já sim, mas agora estava mais forte. Muito mais forte. Ele me olhou e disse com tímido e com aquele jeito único de temer o que o faz bem: - Tó, é pra você. Quando eu vi o que era senti meu corpo gelar, ou queimar não sei ao certo – era uma garota de quase 9 anos. Não sabia o que fazer, ver Scooby Doo não me serviu para nada. Só sei que queria ficar ali, pra sempre. Ele me deu seu bonequinho favorito do Cavalheiro do Zodíaco e uma folha com algo desenhando, era ele e eu. De mãos dadas. – tenho até hoje guardado, junto com tudo que ele me fez sentir. Sinto que é como sonhar, que a facilidade para lembrar, é a vontade de nunca esquecer. Eu olhei para ele, ele disse ‘eu te amo!’-, e eu saí correndo para dentro de casa. Não sei o que me deu, acredite se tem algo que me arrependo é disso, eternamente.

No sábado de manha acordei feliz, seria minha primeira apresentação, apesar de dançar só uma música, minha fantasia era super colorida – e você sabe o quanto eu gosto de cores -, eu estava entusiasmada e depois de dançar iria dizer pro Guilherme que eu também amava ele, e daria algo bem legal para ele, minha coleção de bolinhas de godê, algumas figurinhas ou talvez o meu dinossauro. Estava quase pronta, minha mãe estava ansiosa e orgulhosa, eu iria dançar com toda a graciosidade que escondida dentro de uma carcaça que amava. Amava muito. Então, eu fui. Apresentei-me. Fui aplaudida. Tirei fotos. E o celular do meu pai tocou – lembro do aparelho ser semelhante ao um tijolo com antena -, sei que ele olhou pra mim e me abraçou. Minha mãe já mostrava sinal de nervosismo, então meu pai suspiro: - O Guilherme sofreu um acidente.
Não sei ao certo se Deus escolhe os preparados ou prepara os escolhidos. Só sei que não precisava de um motivo para odiá-lo. A vida não é medida pelo número de vezes que você respirou, mas pelos momentos em que você perdeu o fôlego. Eu fiquei sem ar. Ele estava vindo de bicicleta até o Teatro de Assis para me ver dançar, quando passou pelo cruzamento não viu a caminhonete que vinha em sua direção, ele estava com pressa. Ele queria me ver rodopiar que nem pião. Eu o perdi na hora. Eu perdi o amor da minha vida. Eu não disse o quanto o amava. O amor é o ridículo da vida, a gente procura nele a pureza impossível, uma pureza que está sempre se pondo, indo embora, a vida veio e o levou com ela. Eterno, é tudo aquilo que dura uma fração de segundo, mas com tamanha intensidade que se petrifica, e nenhuma força jamais o resgata.
Hoje eu sou um pequeno pedaço de tudo que ele me deixou, a presença da ausência sempre vai estar aqui, nada pode substituir. Nada. Quem sou eu já não importa, nem nunca importou. E mesmo que eu não te veja, posso sentir quando você pensa em mim, passaria por cima de qualquer obstáculo e mudaria tudo mais de mil vezes, por você, para cuidar de você. Eu te amo muito, inferno.

14 maio, 2008

Craque

A idéia de curar ou afugentar minhas frustrações nas drogas nunca passou pela minha cabeça, acredito que comprar alguns chocolate e ver Titanic ou Ghost seja mais compatível com meu jeito hostil de lidar com tudo. Sim, crescimento pessoal é muito doloroso.
Se bem, que nunca tive a oportunidade de me questionar sobre isso, talvez com um pouco de
maconha eu veja que o mundo nem é tão ruim assim. Eureka! Eu poderia deixar de grande parte do que me persegue, do que me faz querer fugir de mim. Não, minha quase asma não permitiria tal atrevimento. Fico com meu orgulho e lágrimas secas. Deixo a maconha para os quase fracassados.
A minha realidade é o que não consigo nunca. Já me acostumei com tudo que me é negado, eu creio que desistir seja a forma mais inteligente de tentar permanecer intacta, embora queira muito, a ganância corresponde a tudo que deixo estar como está.
O que há de revoltante num estilo de vida individual? As pessoas se irritam com aqueles que
adotam padrões de vida muito individuais.
Elas se sentem humilhadas, reduzidas a seres ordinários, com o tratamento extraordinário que eles dispensam a si mesmos. E usar craque ou êxtase não vai fazer de você alguém com poderes
titânicos. Deixe de ser idiota, em vez de comprar droga dê o dinheiro para mim, eu coleciono moedinhas.
Eu tenho um problema. Na verdade, vários, mas o problema em questão é que eu quero sempre transformar acontecimentos convencionais em eventos cinematográficos, aquela velha história de "ter coisas pra contar". Mas isso cansa. E o uso de drogas não fará suas histórias serem melhor que as minhas. Você vive uma inventada realidade e eu uma realidade inventada. Tudo depende dos interesses. O que vai vender mais: desabafos de uma garota de 17 anos fracassada e sem coração, ou aventuras de um drogado que foge da policia?-
ok, não responda.
Não preciso fabricar nenhuma boa consciência, não sofro disso. Minha vida é um amplo progresso entre zero e um. Deixe de ser esse retratista tratante. Entre para o
time de futebol de sua escola, do seu bairro ou dos traficantes que te vendem a ‘felicidade instantânea’ – ignore esse último comentário, ou não.Desde pequena jogo bola, no próximo texto vou contar como tudo começou, construir uma carreira não é fácil. Acredito em momentos de exceção. Admito que quando estou em campo me sinto menos presa e quase livre, correr atrás de algo, mesmo que seja uma bola é idiota o suficiente, mas me faz bem, ali eu tenho um objetivo: dar o melhor de mim, fazer gol, ganhar. Não que eu saiba perder, mas digamos que aceito a situação com toda classe e indiferença. Costumam me chamar de craque, mas admito que nem sei por que tal nomenclatura – olho para minhas mãos. Então, pratique esportes. Futebol, handebol, basquete, sexo, ciclismo, corrida... – caso você tenha mais de 85 anos aconselho xadrez ou maconha. Sexo não é aconselhável, paradas cardíacas acontecem frequentemente, entendeu?

10 maio, 2008

Feche a luz e desligue a porta

Dormir é uma das minhas atividades preferidas, veja bem, não que eu seja preguiçosa ou goste de alimentar a fadiga, longe de mim, o fato é que assim é o único jeito de me livrar de grande parte das coisas que me atormentam. Minha mãe diz que eu estou em depressão. Eu discordo. Apenas prefiro fingir de olhos fechados. Talvez eu seja teu gato preto, ou talvez seja só um carma inacabado e malfeito – se bem que a idéia do gato me atrai mais, fico bem de preto -, poderia apenas vomitar alguns palavras que fizesse sentido e lhe impressionar com uma mentira vulgar – não que eu não goste de mentiras, elas costumam me divertir mais que desgraças alheias. Nossa, minha mãe está criando um monstro. A verdade é que prefiro ser mais temível do que amável.
Escrevo para poder me entender, escrevo para mim. Tento descobrir onde é que eu estou errando, sou um simulacro de idéias: alguém que está sempre mergulhando num abismo sedutor procurando melancolias, tristezas, remorsos, pois assim acho respostas e me completo. Vivo esperando e procurando um trevo no meu jardim, o problema é que ultimamente nem tempo de procurar eu tenho. Acho que não sei quem sou. Só sei do que não gosto – e se você for uma pessoa nem venha com graça que te furo com a faquinha do rocambole -, olhar ameaçador.
Encontrando minha intensidade, cuja nem sabia que existia, provavelmente me faria levantar da cama num sábado à tarde e ir comer um algodão doce. Preposições costumam me acompanhar até na hora de escovar os dentes, já tentei negociar, as miseráveis não vendem a ausência.
Sofro de tudo que pode ser dramático o suficiente para um roteiro de novela mexicana – acredito que me daria melhor que a Maria do Bairro -, repulsão instintiva que se afasta de outros, não gosto do coletivo, meu egocentrismo e minha humildade extremista não me deixam usar o nós. Aprendemos tudo sobre a Baía dos Porcos na aula de Civilização Mundial — em que um grupo de estrategistas militares, lá dos anos 1960, fez um plano para invadir Cuba e depor Fidel Castro, e convenceram o presidente Kennedy a adotar o plano. Só que eles chegaram lá e descobriram que havia muito mais soldados cubanos e que também ninguém tinha checado para ver se as montanhas para onde eles deviam fugir por segurança ficavam mesmo daquele lado da ilha (não ficavam).
Muitos historiadores e sociólogos atribuíram o problema na Baía dos Porcos ao "pensamento em grupo", fenômeno que ocorre quando um grupo tem tanta vontade de chegar a uma conclusão unânime que eles preferem não conferir os fatos. Viu porque gosto do individualismo? Não sei se vivo na solidão por opção, tento filmar o que eu penso ou talvez gravar o que sinto só para servir de exemplo, de mau exemplo.
Eu não sou promíscua. Mas sou caleidoscópica: fascinam-me as minhas mutações faiscantes que aqui caleidoscopicamente registro. Amo a angústia de ser incomum, quero ficar guardada no meu quarto e ali permanecer até a hora que achar que posso obter algo de vantajoso do que tem lá fora. Não quero ter ninguém por perto, não quero sentir nada, e se for vicioso? Eu, nada mais sou que mais um ser humano demasiado, que não é composto só de alma, mas sim de carne... que morre e apodrece!
Oscilações de tristeza e definições são entediantes. No fundo é tudo teatro – creio que sou a personagem principal -, um estudado simulacro. Quase todo mundo me odeia – eu odeio todo mundo e sou correspondida -, mas a verdade é que quase ninguém realmente me conhece. Embora tenha pena delas, quero apenas que compareçam em meu roteiro de frustrações para me divertirem. Sim, eu sinto pena. Sabe por quê? Porque a maioria delas não sabe nada além daquilo que pode ver com seus olhos. Elas tiram suas conclusões baseadas no meu mau humor e indiferença gratuita, enfim, não queira me ver com raiva, se eu fosse você sairia correndo sem olhar para trás. E por favor, quando sair feche a luz e desligue a porta.

01 maio, 2008

Do lado de lá

Embora acredite que a morte é só a morte, nada me deixa mais atormentada do que esperar por ela em um encontro que não seja nosso. Nas grandes cidades de um país tão violento, os muros e as grades nos protegem de quase tudo, mas o quase tudo quase sempre é quase nada, e nada nos protege de uma vida sem sentido. Morrer hoje em dia é tão comum, simples e fácil. Nada mais é capaz de me surpreender, está pra nascer o humano trucida que conseguirá superar sua espécie cometendo algo que possa me chocar. Perdeu-se o respeito pela morte, ela já não é tão temida, as pessoas buscam encontrá-la cada vez mais rápido e sem pestanejar conseguem dar um fim a suas vidas. Alguns de formas mais banais, outros num dia qualquer, num momento qualquer, um óbito qualquer.
Você acredita no destino ou no futuro? Para mim, um depende do outro. Se estiver no seu destino que você irá morrer atropelado, não adianta. Você será atropelado. Mas, o que se pode mudar ou talvez ‘enganar’ é pelo fato de ir morar na Inglaterra, talvez em Tóquio ou vá viajar para Tocantins, você só estará mudando a atmosfera de sua morte. Não indo trabalhar na sexta, ou se atrasando na segunda só ira atrasar, e assim algumas pessoas vão levando e vivendo. Um dia após o outro, até não dar mais. Um caminhão passa por cima, acabou. E assim é, você nunca ouviu aquele tipo de noticia sensacionalista em que dizem: ‘ Único sobrevivente de catástrofe aérea,’ ou ‘Mulher leva 12 tiros e acaba ilesa’ – enquanto que por ironia do destino, algumas pessoas comem peixe, algumas vão até a padaria da esquina ou aceitam carona de algum (des)conhecido e nunca mais voltam para casa. Somos apenas uma conversa, poupemos os inevitáveis detalhes sórdidos.

Existe as 4 fases – eu as chamo assim -, da morte: primeiro você não acredita que sua vida acabou, segundo você não aceita e se revolta, em terceiro você tenta barganhar – como se sua casa na praia ou sua BMW tivessem algum valor perante a situação -, e quarta e última vem a depressão, quando mais nada te resta, suas lágrimas explodem pelos seus olhos, você não consegue pensar no depois por medo. Sim, você sente muito medo. Quem tem um por que para o qual viver pode suportar qualquer como. Já morrer é mais simples, pode acreditar. Baseio-me em mortes alheias – que fique claro-, e isso só ocorre em casos de doenças terminais ou quando você for seqüestrado – e sua família não tiver BMW ou casa na praia -, também não é muito aconselhável mexer com mafiosos e derivados. Eles costumam viver de mau humor e adorariam se divertir com sua execução.
É isso. Você morre. Acabou. Fim da linha. Já era. Tchau. Bateu as botas. Esticou as canelas. Não tem mais que se preocupar com o IPVA nem com a camada de ozônio.

A morte em si não é nenhum um pouco parecida com aquela personagem de capuz e foice que sobe das profundezas e coisa e tal. Ela não passa de um anjo. E sua ‘missão’ é buscar as almas que não pertencem mais esse mundo. A morte esta exausta, já passou por diversos lugares, já viu muita coisa. Talvez ela entre de greve, mas isso só seria pior, almas vagando por ruas já tem demais, a morte precisa ser reconhecida, ela quer seu respeito de volta. Chega de vim buscar pessoas antes da hora. Contenha-se e espere na fila, seu dia chegara, pode apostar.
Do lado de lá eu irei continuar todas as minhas revoltas e mártires, todos aqueles meus tantos erros me acompanharam. Quem amamos nunca morrem, apenas partem antes de nós. E lá, continuarei sozinha e não quero esperar nada, minha força está na solidão.
Descanse em paz!